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Wilson Valentim Biasotto

O Brasil no metrô francês

04 Jun 2016 - 06h00
O Brasil no metrô francês -
Contava-me o professor Sanfelice que um casal de amigos seu, em meados dos anos de 1970, passeava em Paris e, de estação em estação do metrô, acabaram se perdendo, não encontravam a saída. Ansiosos, perguntavam aos transeuntes onde encontrariam a saída: "la sortie, la sortie", diziam quase em desespero. As pessoas sorriam e seguiam o seu caminho, sem entenderem que aquele casal se perdera no emaranhado de túneis e estações e que desejava sair para a superfície.


Essa passagem me veio à mente ao perceber que o povo brasileiro está se perguntando onde está a saída. A saída para a crise econômico-financeira, fiscal, moral,


social, religiosa e política; enfim, para esse estado de coisas que se sucedem no Brasil, gerando incertezas e desesperança.


Já não é segredo que a elite capitalista está provocando uma nova ofensiva mundial, em especial na América Latina, para retomar as políticas neoliberais fracassadas 15 anos atrás. O neoliberalismo, sabemos, é a exacerbação do liberalismo, ou seja, a política de tornar o Estado cada vez menor, um estado mínimo, para possibilitar aos banqueiros, industriais e rentistas melhores oportunidades para a exploração do povo trabalhador.


No Brasil, o primeiro passo para a execução desse conceito foi tirar do poder a presidente Dilma, substituindo-a pelo seu vice, Michel Temer. Para essa tarefa, foi minuciosamente elaborado um esquema para a desmoralização do governo Dilma e do ex-presidente Lula e, concomitantemente, para estigmatizar o PT como um partido de corruptos. Contribuíram para isso, principalmente, a grande mídia nacional (Folha, Estadão, Rede Globo). Juntamente com a mídia, atuaram as elites econômicas (leia-se especialmente FIESP); os partidos de Direita, comandados pelo PSDB, inconformado com suas derrotas e carregando consigo o PMDB e outros partidos menores; uma parte do Ministério Público, da Polícia Federal e até mesmo Juízes, inclusive alguns da mais alta Corte.


Consumado o golpe, em menos de um mês, os brasileiros perceberam que a solução não foi adequada. Temer decepcionou a todos aqueles que acreditavam que se tratava de acabar com a corrupção atribuída ao PT. Nomeou mal os seus ministros, vários deles envolvidos na Lava a Jato e, inclusive, perdendo dois deles em dezessete dias de mandato. Conseguiu descontentar o empresariado ao promover uma pedalada gigantesca no BNDES, retirando 100 bilhões que poderiam contribuir para financiar a economia nacional e inflou o déficit público em mais de 70 bilhões; cortou muito do povo trabalhador, retirando bolsa família e minha casa minha vida; ensaia a privatização do que resta de patrimônio nacional e abandonou a saúde e a educação. Além disso, está desconstruindo a política externa e ameaçando retirar dos trabalhadores garantias conquistadas ao longo de décadas de lutas.


E, pior, conseguiu demonstrar aos brasileiros que jamais enfrentará a corrupção pois que, por meio dela, apoderou-se do poder.


Agora, até mesmo grupos midiáticos que ajudaram a tirar Dilma já falam em buscar novas saídas, especialmente com a realização de eleições. Ora, penso eu que se for aprovada nova eleição, será mais um golpe sobre o golpe. E unificar todas as eleições é tirar a oportunidade de os cidadãos especializarem-se em democracia.


Que fazer? Onde está a saída? Como, se dentro do metrô de Paris, os brasileiros perguntam-se uns aos outros: qual a saída?


Particularmente, penso que não encontraremos a saída tão facilmente. Minha posição é que seja convocada uma Assembleia Nacional, exclusivamente Constituinte, para modernizar a Constituição e, por via de consequência, modernizar os três poderes da República. Essa Assembleia teria que encontrar a) meios para o financiamento das campanhas; b) impedir a (re)eleição para cargos do executivo, c) impedir mais que uma (re)eleição para o mesmo cargo do legislativo; d) criar um órgão capaz de fiscalizar a Justiça em todas as suas instâncias; e) humanizar o comportamento policial em todos os níveis; f) impossibilitar a privatização de empresas estratégicas, como o caso da Petrobrás; g) manter o fundo oriundo dos royalties da Petrobras, direcionando-o para a educação e saúde, etc.


Sempre existem outras saídas, mas por enquanto, vamos nos debatendo e perguntando: "la sortie, la sortie".


Membro da Academia Douradense de Letras. e-mail: [email protected]

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