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Meio Ambiente

MS é o que mais comercializa agrotóxico no País, aponta pesquisa

23 Out 2019 - 20h00Por Valéria Araújo
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) são registradas 20 mil mortes por ano devido o consumo de agrotóxicos - Crédito: DivulgaçãoSegundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) são registradas 20 mil mortes por ano devido o consumo de agrotóxicos - Crédito: Divulgação

Mato Grosso do Sul é o que mais comercializa agrotóxico no País. É o que apontam dados do Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, elaborado pelo Ministério da Saúde em 2018. De acordo com o estudo, de 2013 para 2014, MS apresentou o maior percentual de aumento da comercialização de agrotóxicos, em dados absolutos, com 102,2%.  O Estado também ficou em 4º lugar entre os estados que apresentaram o maior crescimento da comercialização de agrotóxicos por área plantada, com 24,31 kg/ha.

A mesma pesquisa mostra ainda que no período de 2007 a 2015, observou-se crescente aumento do número de notificações por intoxicações por agrotóxicos, possivelmente em decorrência do aumento da comercialização dessas substâncias e da melhoria da atuação da vigilância e assistência à saúde para identificação, diagnóstico e notificação dos casos. O Estado de MS registrou 139 casos em 2007, 138 em 2008, 158 em 2009, 178 em 2010, 236 em 2011, 240 em 2012, 234 em 2013, 237 em 2014, totalizando nesse período 1.846 casos. No Brasil, durante esse período, houve acréscimo de 139% das notificações, sendo o total acumulado de 84.206 casos.

Nos Estados Unidos, em 2000, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) concluiu que o agrotóxico clorpirifós oferece grande risco, principalmente sobre o sistema nervoso e o desenvolvimento do cérebro e o fígado. Desde então, o produto não pode ser comercializado para uso urbano no país, e os agrotóxicos que contenham a substância têm uso restrito.

Já no Brasil, o seu uso como desinfetante domiciliar foi restrito em 2004, cinco anos após o caso ocorrido em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, onde 112 funcionários do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) foram fortemente intoxicados.Já o temefós, usado pelo governo federal no combate à dengue, foi substituído pelo diflubenzuron (DFB) em 2001, depois de 34 anos de uso. Na agricultura, ambos são utilizados em todo o país.

Diagnóstico em MS

Buscando identificar o quanto se consome de agrotóxico em Mato Grosso do Sul, a Justiça Federal sentenciou os Governos Federal e Estadual a capacitarem o Laboratório de Saúde Pública no Estado de Mato Grosso do Sul (Lacen/MS) para realizar a pesquisa periódica de resíduos agrotóxicos na água consumida pela população da região de Dourados, com mais de 200 mil pessoas.

A sentença, da 1ª Vara Federal de Dourados, estipulou ainda a cobrança de multa de mais de R$ 90 milhões, a ser paga pelo Governo Federal, por descumprimento de decisão liminar de 2016 que determinava a análise da água. De acordo com o Ministério Público federal e Ministério Público Estadual, o objetivo é apurar possível relação entre a contaminação da água por resíduos de agrotóxicos provenientes das lavouras e a saúde dos moradores, principalmente o aumento do número de casos de câncer registrado na região de Dourados.

A sentença determina o uso da multa, obrigatoriamente, na capacitação e aparelhamento do Lacen/MS, seja por meio de repasse vinculado de verbas ao Governo do Estado, seja pela aquisição direta e entrega de equipamentos. A intenção é obter informações para subsidiar a tomada de decisões sobre políticas públicas voltadas à prevenção de danos à vida e à saúde da população.

Enquanto o Lacen/MS não estiver apto a verificar presença de agrotóxicos na água potável, a Justiça determinou que a União providencie análises mensais na água consumida pela população de Dourados, por laboratório habilitado e às suas custas, até que a condenação imposta na sentença seja cumprida.

Atualmente, a água potável da região vem do Rio Dourados e de aquíferos subterrâneos. A Justiça considerou “provável” a exposição da população a agrotóxicos através da água potável. Quando foi ajuizada, a ação citava laudo do Laboratório de Saúde Pública do Paraná (Lacen/PR), que analisou a água do Rio Dourados no período de janeiro a agosto de 2010. Foi encontrada a presença do inseticida, pesticida e formicida clorpirifós etílico (0,38 μg.L) e do larvicida temefós (0,05 μg.L). Não só o consumo de água com estes produtos é prejudicial à saúde, como também afeta a alimentação dos peixes do rio, que concentram altos níveis das substâncias nocivas.

Contrabando

Rota do contrabando em Mato Grosso do sul, a cidade de Dourados registrou a apreensão de 900 quilos de agrotóxico no último dia 27. O flagrante aconteceu na BR 163 pela Polícia Rodoviária Federal (PRF). No último dia 30 a Polícia Militar Ambiental multou em R$ 90 mil o responsável pela carga de produtos perigosos, contrabandeados do Paraguai. A carga do produto perigoso seguia para a cidade de Lucas do Rio Verde e era transportada misturada a caixas de leite.

Além do crime de contrabando, o infrator também responderá por crime ambiental, previsto pelo artigo 56 da Lei 9.605/1998 que diz: produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos.  A pena é de um a quatro anos de reclusão, só pelo crime ambiental.

Consumo de agrotóxico mata 20 mil por ano

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) são registradas 20 mil mortes por ano devido o consumo de agrotóxicos. O Brasil vem sendo o país com maior consumo destes produtos desde 2008, decorrente do desenvolvimento do agronegócio no setor econômico, havendo sérios problemas quanto ao uso de agrotóxicos no país: permissão de agrotóxicos já banidos em outros países e venda ilegal de agrotóxico que já foram proibidos. A exposição aos agrotóxicos pode causar uma série de doenças, dependendo do produto que foi utilizado, do tempo de exposição e quantidade de produto absorvido pelo organismo.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), os principais afetados são os agricultores e trabalhadores das indústrias de agrotóxicos, que sofrem diretamente os efeitos dos agrotóxicos durante a manipulação e aplicação, no entanto toda a população está suscetível a exposições múltiplas a agrotóxicos, por meio de consumo de alimentos e água contaminados. Gestantes, crianças e adolescentes também são considerados um grupo de risco devido às alterações metabólicas, imunológicas ou hormonais presentes nesse ciclo de vida.

Em relação a mortes, dados da pesquisa mostram que a incidência de óbitos em Mato Grosso do Sul é de 0,04 para cada 100 mil habitantes. Roraima é o Estado que lidera mortes por agrotóxico com uma incidência de 0,8 pra cada grupo de 100 mil habitantes.

Nutricionista diz que sociedade precisa ser exigente no consumo sem veneno

O Conselho Nacional de Nutricionistas tem se mobilizado no Brasil para incentivar a produção orgânica. O nutricionista Élido Bonomo, membro do grupo de estudos em Agroecologia da Universidade Federal de Ouro Preto (SP) diz que a sociedade precisa ser exigente no consumo e não aceitar mais produtos envenenados com agrotóxico.  Ele alerta sobre as consequências causadas pela utilização de agrotóxicos para a saúde pública no Brasil, país que mais utiliza agrotóxicos no mundo.

Segundo ele,  os ruralistas utilizam cada vez mais agrotóxico e variedades do produto para garantir o mesmo volume de produção, tendo em vista que os insetos estão cada vez mais criando resistência. “Isso leva um desiquilíbrio da fauna e da flora e leva problemas ambientais como as intoxicações causadas pelas pulverizações de lavouras próximas de escolas, comunidades, além da  água de rios e comunidades, bem como o subsolo. É preciso rever esse modelo se formos pensar em modelo sustentável”, explica.  

Conforme o nutricionista, estudos mostram que a contaminação inicia no agricultor, que fica exposto e passa por quem consome os produtos produzidos e por quem está próximo as lavouras.  No corpo esses produtos causam intoxicação agudas e crônicas, que podem levar a morte.

Bonomo explica ainda que a contaminação do alimento não sai com o habito de lavá-lo, tendo em vista que o agrotóxico não fica na superfície, apenas. “Mais de 30% dos agrotóxicos comercializados no Brasil são proibidos em outros países. O produto vem do solo, passa para a raiz, caule, folhas e para os frutos de forma interna. Lavar ajuda, mas não retira o pesticida do alimento”, explica.

Para o nutricionista, o caminho para garantir produtos saudáveis na mesa é pelo desenvolvimento sustentável, baseado na produção de alimentos orgânicos com base agroecológica. “Nós temos experiência no Brasil e no mundo de que é possível produzir alimentos de altíssima qualidade e quantidade, com manejo adequado e assistência técnica e incentivo financeiro governamental. Para isso é necessário que a sociedade passe a ser exigente no consumo, sendo consciente de que não podemos nos envenenar. Não podemos chegar no futiro carregando a vergonha que nós continuamos colocando veneno naquilo que íamos comer”, ressalta.

Existem alternativas?

A agroecologia deve ser compreendida como Ciência e prática interdisciplinar que considera não só o conhecimento científico advindo das Ciências Agrárias, da Saúde, Humanas e Sociais, mas principalmente as técnicas e saberes populares (dos povos tradicionais) que incorporam princípios ecológicos e tradições culturais às práticas agrícolas gerando uma agricultura sustentável e promovendo a saúde e a vida digna. Tem como princípios fundamentais a solidariedade, sustentabilidade, preservação da biodiversidade, equidade, justiça social e ambiental, soberania e segurança alimentar e nutricional.

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