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“Guardar mágoa atrapalha a vida das pessoas” diz psiquiatra

09 Mar 2015 - 06h00
Entrevista com Alessandro de Matos Santos - médico psiquiatra. - Crédito: Foto: Hédio FazanEntrevista com Alessandro de Matos Santos - médico psiquiatra. - Crédito: Foto: Hédio Fazan
O médico psiquiatra Alessandro de Matos Santos, recebeu em seu consultório a rua Toshinobu Katayama, 1305, a equipe de O Progresso para falar sobre um dos transtornos mais comuns entre as pessoas nos dias de hoje: o da ansiedade. O médico afirma que tem atendido inúmeras pessoas com estes sintomas e o mais impressionante é o grande numero de jovens com este problema. O médico também fala da relação da ansiedade com alcoolismo e outras drogas e também dá dica de como procurar levar uma vida com mente saudável. “O ódio atrapalha a vida das pessoas”, afirma o psiquiatra que sente orgulho de ter tido como primeiro emprego o jornal O Progresso quando pertencia a Guarda Mirim. Leia.

O que se define por ansiedade?


“A ansiedade é um sintoma primitivo que todos nós temos. A ansiedade é aquilo que nos assegura a querer seguir regras, cumprir metas, conseguir obter êxito, é aquela busca, então, o ansioso é aquela pessoa preocupada que está sempre tentando resolver as coisas, sempre tentando ser correto, certinho, tenta corresponder as expectativas. Na realidade são pessoas que nesta vida moderna lutam muito por muito pouco. É a necessidade de ter um carro melhor, um celular melhor uma roupa melhor, ou seja, conquistar mais coisas, então, a gente percebe que muitas vezes os valores se invertem um pouco, talvez essa necessidade tamanha em conquistar as coisas faz com que as pessoas nesta busca de cumprir metas, de cumprir estas expectativas, faz com que as pessoas comecem a sofrer um pouco mais, começa a ficar mais preocupada, perder sono, ter sensação de desespero, normalmente pela dificuldade em estar lidando com os conflitos, em estar administrando estas dificuldades é que as doenças ansiosas começam a aparecer”.

A ansiedade tem a ver com fatores genéticos?


“Sim, é comprovado que filhos de pais ansiosos tem uma tendência maior de desenvolver, mas a gente sabe que a genética por si só não determina, a ansiedade tem muito a ver com o meio, como a pessoa foi educada, com as exigências, com as cobranças, com a maneira com que as pessoas lidam com frustrações, com a resiliência que cada um tem, então, não seria somente a genética, seriam fatores ambientais, exposição a drogas, exposição a álcool, capacidade que cada um tem em lidar com seus conflitos, tudo isso junto que acaba determinando”.

O alcoolismo pode ser uma das causas da ansiedade?


“Muitas vezes o ansioso tenta resolver o problema dele ingerindo álcool. É aquele hábito, estou ansioso, estou preocupado vou tomar uma para relaxar e muitas vezes as dependências, o acesso a outras drogas pode começar com um mero uso do álcool no dia a dia. A gente sabe que o álcool e que o tabaco no futuro podem desenvolver outras dependências. Normalmente se analisar um dependente de cocaína, dependente de crack, normalmente ele não começou usando estas drogas, ele começou em uma droga mais leve, cigarro e bebida alcoólica e pode se iniciar para resolver uma questão de ansiedade, uma questão de angustia. As causas são as mais variáveis, mas que o transtorno ansioso acaba favorecendo o sujeito, de repente a cair, a passar a usar uma droga para tentar se aliviar, isso é comum”.

Tem relação entre a obesidade e os transtornos de ansiedade?


“A gente percebe, por exemplo, as pessoas que são obesas, muitas delas acabam tentando aliviar sua angústia na comida. Quando a pessoa não bebe e nem fuma ela come, são as compulsões. Então, com certeza, a gente avaliando é bastante prevalente o número de transtornos de ansiedade em obesos, em pessoas que acabam tendo que se submeter a cirurgias bariátricas e por aí vai. A gente sabe que existe uma relação também no caso dos pacientes cardiopatas. Tem vários pacientes cardiopatas que apresentam vários transtornos de ansiedade, síndrome do pânico, transtorno ansioso generalizado, transtorno obsessivo compulsivo, estão entre as principais doenças ansiosas”.

O mundo agitado de hoje favorece a ansiedade?


“Eu acho que o mundo de hoje traz uma série de adversidades que acabam criando um ambiente ideal para o indivíduo ser ansioso. Eu penso que uma vida ideal, uma vida em que se possa ter saúde mental é baseada principalmente no fato de ter que aprender a lidar com os seus conflitos sem sofrer, ou seja, conseguir administrar os conflitos sem sofrer. Conseguir lidar com problemas no trabalho, conseguir administrar os problemas em casa e de fato resolver isso. Isso tem a ver com a personalidade da pessoa em deixar o problema para depois, tentar jogar para debaixo do tapete e a pessoa acaba não se resolvendo e com o passar do tempo e ela fica cada vez mais ansiosa, angustiada, preocupada, então, eu acho que vc tem a capacidade de resolução da vida, aprender a resolver os problemas, ter uma vida saudável no sentido de dormir bem, se alimentar bem, fazer uma atividade física, não ingerir álcool, não fumar, não usar drogas, conseguir ser uma pessoa que consegue se resolver, eu acredito que seja o modelo de vida ideal. Muitas vezes as pessoas têm diferenças, têm brigas, têm diferenças familiares, têm conflitos familiares, em que um não fala com o outro, um acaba ficando bravo com o outro, por essa ou por aquela razão e acaba guardando mágoa e mágoa é uma coisa que atrapalha muito a vida da pessoa. Eu penso que você ser assertivo, você conseguir se resolver, conseguir levar uma vida sem mágoa, conseguir deixar os problemas no trabalho, não carregar para dentro de sua casa, outra coisa que é importante, não vou defender essa ou aquela religião, mas ter uma fé, ter uma crença, isso é muito importante, eu acho que tudo isso, em conjunto só tende a melhorar a vida da pessoa. Tende a melhorar o ambiente familiar, a relação com esposa, com filhos, com colegas no trabalho, eu creio que o ser humano precisa se adaptar a pensar o seguinte: a gente tem que render, tem que produzir, tem que cumprir metas, mas se você não fizer isso o mundo não vai acabar, quer dizer é ter resiliência, é entender que eu também falho, que eu não sou perfeito, a tendência ao perfeccionismo do ser humano, as pessoas cada vez mais querem mais, não aceitam falhar, acho que é tudo isso em conjunto”.

Isso tem a ver com a auto cobrança?


“Não tenha dúvida. A auto cobrança gera mais angústia, por isso, que eu estou dizendo na questão da resiliência. É você aceitar. Ora essa, não consegui tal coisa, mas porque que eu não consegui, por isso, por isso, por isso, posso tentar melhorar, posso tentar fazer diferente, posso tentar me resolver de outra forma, porque quando você é muito rígido com você mesmo, você acaba se podando de um monte de coisas, eu acho que um pouco de ansiedade, faz parte da vida da gente e esse pouco de ansiedade é o que nos impulsiona a estar tentando cumprir, suprir, corresponder, atender, agora quando isso começa a ganhar uma proporção muito maior, quando começa a adoecer por conta de um sintoma de ansiedade, quando eu vou chegar em uma situação que começo a ficar com mão gelada, bolo na garganta como se estivesse com um nó na garganta, vou ter que ficar indo no banheiro o tempo todo, não durmo, isso já é prejudicial, isso atrapalha, prejudica o desempenho da pessoa, naquilo que ela vai fazer, naquilo que ela tem que corresponder, um dos maiores exemplos é do vestibulando. Muitas vezes o vestibulando não se prepara como tem que se preparar o ano todo, então, chega perto da prova fica ansioso, eu trato vários jovens, pela cobrança, pelas demandas de vestibulares, com a vida adulta que está se aproximando, então, é assim, um leque muito grande de coisas”.

Qual a influência do meio em que a pessoa cresceu neste contexto?


“Eu acho que a base da formação do cidadão começa em casa. Hoje em dia a gente vê uma outra realidade onde pela necessidade e pela demanda os pais têm que trabalhar, a mãe tem que trabalhar. No passado a mãe ficava em casa e dava conta de tudo, então a educação era de outro tipo, a minha foi assim também. Hoje em dia muitas vezes os nossos filhos, eu ainda não tenho, precisam ser cuidados por pessoas que a gente contrata para a nossa casa e por escolinhas, então, eu penso que a educação começa em casa, então tem que ter tempo para o filho, a gente entende que trabalhar é necessário para conseguir aquilo que há de melhor, mas tem que cuidar do filho, tem que educar, tem que ter tempo para o filho para que ele aprenda valores morais dentro de casa, aprender a respeitar os mais velhos, aprender a se situar nas condições de vida, nos momentos sociais, tem que entender que ele tem limites”.

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