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Subnotificação da Covid preocupa pesquisadores após avanço dos casos de síndrome respiratória em MS

23 Jul 2020 - 07h02Por Da Redação
(Foto: Divulgação) - (Foto: Divulgação) -

A doença que é responsável por mais de 621 mil mortes no mundo, mais de 82 mil no Brasil e 257 mortes em Mato Grosso do Sul desafia gestores públicos. Os desafios para enfrentar a pandemia não estão só na expressividade dos números da Covid-19 e na dificuldade de combate ao novo coronavírus, mas também na subnotificação e na baixa testagem que refletem a dificuldade de acesso, confiabilidade e disponibilidade dos dados sobre a doença. E é isso que uma rede de pesquisadores de universidades públicas federais quer descobrir: o que há por trás dos números das Síndromes Respiratórias Agudas Graves (SRAGs) e qual é a relação delas com a Covid-19. A suspeita não é nova, mas os dados de óbitos por SRAGs só começaram a ser disponibilizados pelas autoridades de saúde do estado nessa semana.

De acordo com o Relatório técnico descritivo: Geocartografia dos Indicadores de Morbidade e de Mortalidade da COVID-19 em Mato Grosso do Sul, da 27ª à 29ª semanas epidemiológicas, o período de 21 a 27 de junho, foram registrados, em Mato Grosso do Sul, 28 óbitos por Covid-19, enquanto as SRAGs foram responsáveis pela morte de outras 60 pessoas. Isso significa que morreram 2,14 vezes mais pessoas por Síndromes Respiratórias Agudas Graves do que por Covid-19 em uma semana no estado. 

 

“A correta interpretação desse dado é fundamental para que as autoridades reconheçam a necessidade de alcançar níveis de testagens massivos para evitar distorções nos registros e interpretações dos dados. Ou admitimos os níveis que estas taxas de letalidade representam como possíveis casos de Covid-19 ou admitimos a baixíssima testagem nesses municípios. Acreditamos que tem mais gente morrendo de Covid-19 e muito mais casos que não aparecem nos dados oficiais”, sentenciou o professor e pesquisador da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Adeir Archanjo da Mota, que coordena uma equipe de pesquisadores multidisciplinares - epidemiologista, geógrafos(as) e comunicadora - da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB) e de acadêmicos dessas universidades.

De acordo com os pesquisadores, as SRAGs estão com proporções acima da média dos anos anteriores quando comparadas com as mesmas semanas epidemiológicas de 2019. O relatório aponta o expressivo aumento de notificações de casos de SRAGs  no estado a partir de 07 a 13 junho, ao registrar mais de 250 notificações por semana e atingindo mais de 400 notificações no período de 05 a 11 de julho, conforme demonstra o Gráfico 1. A demora na atualização dos dados pelos municípios também dificulta a compreensão da doença. O relatório indica que “aparentemente a 29ª semana [12 a 18 de julho] apresentou mais de 300 casos notificados de SRAGs”. “Muitos casos de internações e óbitos registrados como SRAGs não específicas podem ser casos de Covid-19. E isso nos chama a atenção para a subnotificação da doença, a baixa proporção de população testada e pela baixa sensibilidade do teste, aplicado de forma pouco invasiva (swab nasal ou oral)”, analisa Archanjo da Mota. O epidemiologista Cremildo João Baptista, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), explica que nem tudo que é SRAG é Covid-19 e vice-versa: “É preciso realizar melhor a diferenciação e, sem testes, essa diferenciação pode ficar comprometida”

Ainda de acordo com o relatório técnico, 31 municípios do MS atingiram taxas de letalidade com valores acima da taxa estadual (1,4% em 20 de julho) sendo que, desses, 15 municípios apresentaram taxas de letalidade maior do que o dobro da taxa média estadual (conforme Tabela 1). O epidemiologista e professor da UFMS, Cremildo João Batista, explica que a questão da letalidade é crítica: “não podemos como epidemiologistas e profissionais de saúde comprometidos com a verdade, com a ciência e com os fatos, validar as taxas de letalidade atualmente definidas pela falta de testes que identificariam o quantitativo, pelo menos, esperado de pessoas infectadas. Não se podem determinar taxas de letalidade mais próximas da realidade sem testes em massa. O que temos em termos de testes positivos é somente uma ponta do iceberg”. 

Alerta Covid-19

Juti, Campo Grande, Bataguassu, São Gabriel do Oeste, Dourados, Corumbá, Anaurilândia, Ladário e Chapadão do Sul são municípios de Mato Grosso do Sul que inspiram cuidado e medidas urgentes. A análise apresentada pelo relatório de pesquisa evidenciou que Campo Grande e Juti; Bataguassu e São Gabriel do Oeste possuem índices de morbimortalidade por Covid-19, respectivamente, 5 e 4, que indicam situação de saúde pública grave no contexto da pandemia pelo novo coronavírus. “O fato de estarem em três macrorregiões distintas é um agravante ainda maior, em função tanto da distribuição espacial dos serviços de saúde quanto da ocupação global de leitos de UTI. Outros municípios que também exigem atenção redobrada e ações equivalentes à dimensão do problema são os municípios com índice 3: Dourados, Anaurilândia, Corumbá, Ladário e Chapadão do Sul”, recomendou o relatório. 

Mortes pela Covid-19

A variação do indicador de novos registros de óbitos pela Covid-19 evidencia que os municípios de Campo Grande (aumento de 84% - aumento de 43 para 79 óbitos), Dourados (aumento de 59% - aumento de 32 para 51 óbitos) e Corumbá (aumento de 109% - aumento de 11 para 23 óbitos) tiveram aumento expressivo no número de óbitos pelo novo coronavírus e registraram 67 novos óbitos no período de 04 a 21 de julho. O relatório de pesquisa indica que houve um incremento percentual de 200% no número de óbitos de São Gabriel do Oeste e Anastácio. Esses dois municípios saltaram de 1 para 3 óbitos causados por infecção pela Covid-19 (conforme Mapa 1). 

Novos casos

O relatório também apontou que 20% dos municípios de Mato Grosso do Sul (Campo Grande, Dourados, Corumbá, Bataguassu, Três Lagoas, São Gabriel do Oeste, Naviraí, Sidrolândia, Chapadão do Sul, Juti, Ladário, Maracaju, Rio Brilhante,  Itaquiraí, Coxim e Iguatemi) concentraram o crescimento de 88% no número de novos casos de Covid-19, ou seja, 5.338 novos casos em apenas duas semanas epidemiológicas (período de 05 de julho a 18 de julho). Desse total de novos casos, 3.640 estão concentrados em cinco dos onze pólos de microrregiões de saúde, que contam com leitos hospitalares disponíveis para todos os demais municípios das respectivas microrregiões (Campo Grande, Dourados, Corumbá, Três Lagoas e Naviraí). 

De acordo com o relatório, tão importante quanto o crescimento numérico de novos casos é o crescimento percentual, que permite identificar possíveis associações espaciais entre municípios limítrofes, como nas conurbações de Corumbá-Ladário e Aquidauana-Anastácio, ou ainda em municípios limítrofes de distintas micro e macrorregiões de saúde, conforme destacadas as variações nas porcentagens de: Anaurilândia e Bataguassu; Bela Vista e Antônio João; Caarapó, Juti, Naviraí e Itaquiraí (conforme Mapa 2).

Enfrentamento da realidade 
 
Para a pesquisadora em Comunicação, Saúde e Políticas Públicas da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB), professora Fernanda Vasques Ferreira, os gestores públicos precisam encarar a realidade da pandemia com responsabilidade com a preservação das vidas e pautados pela ciência. “Estamos diante de um fenômeno complexo - a doença. Não há espaço para ações que denotem amadorismo por parte dos gestores públicos. A doença já mostrou quais as marcas que irá deixar na sociedade e nos setores em todas as dimensões da vida humana. É momento de acolher os estudos científicos com seriedade e atenção, interpretá-los adequadamente e colocar em prática medidas que, de fato, reduzam os impactos da doença na vida das pessoas”, enfatizou a pesquisadora. 
 
Segundo Fernanda Vasques Ferreira, ações coordenadas e balizadas nos princípios da saúde coletiva além de serem mais eficientes, eficazes e resolutivas, também transmitem o adequado nível de comunicação à população da gravidade da situação que a pandemia impõe. “Culpabilizar os indivíduos, responsabilizá-los por mortes e transferir para as pessoas a decisão que deve ser das autoridades que ocupam cargos institucionais - em especial os gestores públicos - é uma leviandade. A doença não pode ser tratada com preconceito, com estigmas, sob a guarida da religiosidade ou da moralidade. A doença precisa ser tratada pela ciência”, sentenciou a pesquisadora que tem projetos de pesquisa na área de comunicação e prevenção para a saúde. Segundo ela, é preciso tomar cuidado ao comunicar as informações oficiais relativas à Covid-19 para não criar falsas expectativas que possam gerar otimismo sem correspondência com a realidade.
 
O Relatório técnico descritivo: Geocartografia dos Indicadores de Morbidade e de Mortalidade da COVID-19 em Mato Grosso do Sul, da 27ª à 29ª semanas epidemiológicas também indica que devem ser combatidas práticas de desinformação, descontextualização, infodemia e disseminação de fake news com o objetivo de preservar vidas. De acordo com a professora, das 231 notificações no catálogo do Canal Saúde Sem Fake News do Ministério da Saúde, apenas 30 são informações correspondem à verdade. O Canal incluiu a etiqueta Novo Coronavírus Fake News para distinguir as notificações falsas da Covid-19 das notificações falsas relativas a outras áreas da saúde. Quem tiver dúvidas sobre as informações disseminadas nas redes sociais deve enviar uma mensagem de Whats App para o número (61) 99289-4640 com texto ou imagem da informação duvidosa. 
 
O relatório foi produzido pelos professores doutores Adeir Archanjo da Mota, da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD); Cremildo João Baptista, Ana Paula Archanjo Batarce, Elisa Pinheiro de Freitas, Eva Teixeira dos Santos, Mauro Henrique Soares da Silva, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS); Fernanda Vasques Ferreira, da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB); e pelo mestre Anderson Antonio Molina da Silva, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), com o apoio técnico dos acadêmicos Antonio Idêrlian Pereira de Sousa e Pedro Antônio Araújo da Silva, da UFGD; Eduardo Henrique Rezende Santos, Leandro Pereira Santos e Rafael Rocha Sá, da UFMS.

 

 

 

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