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Tecidos feito à base de cacto e de bactérias substituem o couro animal

Mexicanos criaram um tecido respirável, resistente e parcialmente biodegradável à base de cactos

03 Fev 2021 - 09h17Por uol/ecoa
Tecidos feito à base de cacto e de bactérias substituem o couro animal - Crédito: Divulgação Crédito: Divulgação

O "couro" sintético você conhece e, provavelmente, já usou uma peça ou calçado feito com esse material. Feito de polímeros de poliuretano, a partir do petróleo, a alternativa ao produto de origem animal tem um ciclo de vida que deveria nos chamar mais atenção: "Como plásticos, o tecido sintético demora 300 anos para se decompor, liberando gás carbônico durante o processo e contaminando o solo. E conforme os tecidos sintéticos se desgastam, liberam microplásticos, inclusive na água. Escolher usar o tecido sintético (PU) pode ser considerado vegano, mas está longe de ser sustentável para o meio ambiente", explica Monayna Pinheiro, professora do curso de Moda da Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo.

O couro tradicional é feito de pele de animal, o que envolve diversas consequências como o desmatamento e emissões de gases de efeito estufa associados à pecuária. Além da crueldade animal, o processo para tratar a pele, chamado de curtimento, usa produtos químicos nocivos.

Mas já existem alternativas no horizonte - e as mais recentes e promissoras são latino-americanas.

Couro de cacto

Adrián López Velarde e Marte Cazarez buscaram, em suas origens mexicanas, uma opção ao couro que fosse sustentável e sem crueldade. Os jovens se conheceram quando cursavam a mesma universidade em Singapura e viraram sócios após obterem sucesso em suas pesquisas na área têxtil: eles criaram um tecido respirável, resistente e parcialmente biodegradável à base de cactos. Isso mesmo, cactos.

"Nós somos mexicanos, então olhamos para o que nosso solo produz em abundância e que permitisse fechar um ciclo produtivo sustentável, que não gerasse gasto de água ou resíduos prejudiciais ao meio ambiente. A resposta imediata foi o (cacto) nopal. Ele não precisa ser irrigado, tem baixo custo, manejo e produção simples", contam.

O nopal necessita de 200 litros de água para crescer um quilograma de biomassa mas, para isso, não precisa de irrigação. A planta captura essa quantidade de água por meio da umidade externa, graças ao seu mecanismo higroscópico. Em nossa entrevista, eles contam também que a empresa cultiva dois hectares de nopals, com potencial de expansão para mais 40. A capacidade de produção é de 500 mil metros lineares mensais. O cultivo, por sua vez, gera trabalho e renda para os agricultores locais.

"Nossa preocupação com o meio ambiente leva em consideração as emissões de carbono de toda a produção. Ao realizar todo processo aqui, no México, comunidades locais são empregadas e apenas os envios à clientes internacionais tem o transporte via navio ou avião, que emitem poluentes", explicam.

A inspiração

Criada em 2015 pela pesquisadora e designer Carmen Hijosa, o Piñatex é um "tecido" feito com fibras das folhas de abacaxi. Para fazer um metro quadrado são necessárias cerca de 480 folhas de abacaxi obtidas por produção agrícola familiar, nas Filipinas. Mas depois da extração das fibras em um processo semiautomático, são embebidas em resina de ácido polilático à base de milho, e depois enviadas para a Espanha, a fim de receber um tratamento industrial final.

O case inspirou os empreendedores mexicanos, mas viram que o nopal tinha uma performance e resultado superiores e, principalmente, que havia terreno de sobra em seu país para realizar do cultivo ao produto final.

Batizado de Desserto, o tecido a base de cacto ficou conhecido como "couro vegano" na Europa, quando levaram o projeto à Lineapelle, uma Feira Internacional do Couro que acontece em Milão, na Itália. E foi um sucesso. Saíram da feira cheios de contatos e se tornaram fornecedores de marcas de móveis, empresas automotivas e, claro, da moda.

A durabilidade da Desserto é de cerca de dez anos, tem toque e textura suaves, possuem cores variadas - inclusive tons de prateado e dourado. O produto final é feito do nopal e algodão orgânico, de diversas espessuras. Um dos objetivos, afirmam, é se tornarem fornecedores de marcas de luxo, mas também tornar o produto mais acessível. Na ocasião da feira, em 2019, cada metro era vendido a US$ 25. "Estamos buscando maneiras de aprimorar o processo e garantir que marcas independentes e artesãos consigam ter acesso ao produto também", diz Adrián, considerando que o preço é ainda um fator que pesa na decisão de fugir do couro animal.

Vegano, sustentável e brasileiro

Monayna, professora do curso de moda da FAAP, é otimista quanto aos couros artificiais. "Quanto mais pessoas buscam e consomem essas alternativas, haverá mais entrada em grandes mercados." Ela é pesquisadora e estilista - entusiasta de uma moda mais consciente e ecologicamente responsável. "Existem pesquisadores brasileiros desenvolvendo produtos muito interessantes também."

Um deles é a Biotecam, empresa especializada no tratamento de água e fundada por dois engenheiros ambientais e um químico, que tropeçaram na moda. "Em 2017, prestamos uma consultoria ao Museu do Amanhã, aqui no Rio de Janeiro, que estava com um problema relacionado à refrigeração. E conhecemos o laboratório do Amanhã, em que acontecem workshops que mais tarde serão exposições. Na ocasião, o mote era a Moda do Futuro. Havia a ideia de wearables [dispositivos tecnológicos que podem ser vestidos], mas também a vontade de criar um biotecido. A ideia tinha vindo de uma designer norte-americana, em 2009, mas ninguém mais teve um avanço", relembra Hugo Mendes, um dos fundadores da empresa. Eles estavam com dificuldade de cultivar bactérias, que precisam ter sob controle diversas variáveis, como temperatura. Por acaso, um dos sócios da Biotecam já havia trabalhado com o tipo de bactéria específica para a simbiose - a mesma que é usada na produção de kombuchá. Com a expertise em mãos, se ofereceram para ajudar a equipe do museu.

"A principal diferença é que a kombucha é um consórcio de bactérias e leveduras e nós só crescemos a bactéria sem leveduras, além disso a composição do meio de cultura (a 'receita' em que as bactérias crescem) é totalmente diferente. Na kombucha precisa ser chá de camellia sinensis, principalmente, e glicose, para ter as propriedades probióticas e de sabor. No nosso caso a gente usa uma outra composição com nutrientes para as bactérias se reproduzirem e formarem mais celulose, já que o objetivo não é o consumo do líquido."

"Percebemos que aquilo se encaixava muito na nossa visão de empresa, já que trabalhamos com tecnologia voltada para a melhoria do meio ambiente, e vimos que existia uma demanda por produtos de moda sustentável. Talvez o algodão orgânico e tecidos feitos de recicláveis sejam, hoje, o mais próximo disso, mas há ainda questões de uso de produtos químicos durante o tratamento destes insumos."

Essas bactérias produzem a celulose macroscopicamente, ocupando toda a superfície do recipiente em que crescem. O resultado são "folhas" no formato deste recipiente. "Colhemos essa celulose, que se assemelha a uma gelatina, fazemos um tratamento (que pode variar dependendo da finalidade do produto). Elas estão muito hidratadas, portanto é necessário mais um passo no processo, que é o de secagem e que demora alguns dias", explica Hugo.

Hoje, a produção da Biotecam é praticamente artesanal de seu não-tecido, o Texticel. Mensalmente, entregam até cinco metros quadrados nas medidas de 30 cm por 50 cm. "Estamos escalonando nossa capacidade produtiva neste primeiro semestre. A ideia era que isso acontecesse em 2020, mas a pandemia atrasou as etapas. O objetivo é entregar 30 metros quadrados mensalmente, em folhas de 1m por 1,5m. Com isso, conseguiremos baixar o preço e atingir mais marcas do mercado."

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