Mesmo as rupturas mais bruscas não fazem surgir o novo do nada, elas trazem consigo parte do passado. A Diocese de Dourados, a partir fevereiro, terá mudanças, é normal que a troca de bispo gere uma renovação espiritual, pastoral e até administrativa, isto não significa que o bispo que deixa não fez a sua parte, ao contrário, assim como ele imprimiu um modo de trabalhar às diversas relações com o povo, a visão pastoral, a comunhão entre o clero, o novo prelado contribuirá com seu jeito e modo de pensar.
Como a imprensa do Estado e do país já noticiou, o novo bispo de Dourados, a ser ordenado dia 30 de janeiro de 2016, às 17h30, na Catedral, é natural do Paraná, afrodescendente; este fato é importante na medida em que revela o quanto a Igreja Católica valoriza a pessoa pelo o seu ser e não pela cor, já que Dourados teve um bispo português, Dom José de Aquino, um descendente de alemão, Dom Carlos Schimit, dois alemães, Dom Teodardo e Dom Alberto e Dom Redovino, descendente de italiano. Pode-se dizer que tem alguém mais ou menos brasileiro? Não acredito! O que se sabe é que todos amaram estas terras, seu povo, acompanharam suas alegrias e sofrimentos, e, certamente, será assim com o Pe. Henrique, logo Dom Henrique.
Cada bispo tem a sua história, Dom Alberto lutou na II Guerra, Dom Redovino viveu tempo difíceis no interior do Rio Grande do Sul, entrando no seminário com 11 anos de idade. Pe. Henrique, nosso novo futuro bispo, veio de família pobre e, por duas vezes, precisou sair do seminário para trabalhar e ajudar na casa. Neste período, entre outras coisas, foi caminhoneiro, tudo isto enriquece sua história, mas certamente o que foi decisivo para sua nomeação não foi a cor da pele, a descendência, a condição social, foi a sua capacidade de dialogar, de ser humilde e firme ao mesmo tempo, seu conhecimento do Mato Grosso do Sul, sua visão de Igreja, etc.
Estes requisitos são essenciais para que ocorram as mudanças necessárias, porque a vida também muda, e o mesmo acontecerá na Igreja Diocesana (em continuidade com o passado). Um dos fatores mais preponderantes é a conquista e a adesão do clero, religiosos e também dos fiéis, aquilo que pede a Igreja hoje. Nós padres precisamos ter convicções, mas como disse o Papa Francisco, a maior delas deve ser: que o Espírito Santo conduz a sua Igreja, não petrificar a doutrina sem ouvir os ventos do novo. Assim, abertos aos ventos do Espírito devemos esperar o novo “pastor”, para que ele encontre uma família, e não uma estrutura monolítica. E isso vale para todos.
Neste momento, ouço muito dizerem “minha Igreja”, a expressão mais correta é “nossa Igreja”, na qual todos devem encontrar espaço e ninguém deve procurar ser mais que o outro. A expressão “nossa Igreja” exige uma tomada de consciência que devemos fixar o olhar em Jesus Cristo, único e eterno pastor, para evitar a infeliz ideia de posse daquilo que é de todos. Nesta perspectiva, quem não comunga com a Igreja, quem a vê de longe, não se mistura, não sente suas dores, fruto dos nossos pecados, não tem legitimidade para mudá-la, por isso, um presente necessário ao novo bispo será sair da zona de conforto, conhecer, se engajar e contribuir com a Diocese, para que ela seja mais unânime na evangelização e “apaziguação” dos conflitos.
Rezemos, nas proximidades do início do Ano da Misericórdia, para que tenhamos um coração que julga menos e ama mais, para que o outro, seja quem for, não seja olhado como inimigo, mas como filho do mesmo Pai, irmãos na mesma Igreja, pela qual Jesus derramou o seu sangue.
Pároco da Catedral de Dourados, MS. e-mail: [email protected]