O que Katy Perry, o prêmio Nobel de Química e Mato Grosso do Sul têm em comum? Recentemente a cantora norte-americana apareceu em um vídeo da Revista Vogue britânica, no quadro “In The Bag” revelando os ítens que não podem faltar nos seus cuidados diários com a pele, entre eles o One Skin, um creme anti-idade.
Pois o principal ingrediente da marca americana é um peptídeo (biomolécula formada pela ligação de dois ou mais aminoácidos, resultante do processamento de proteínas) desenvolvido em Mato Grosso do Sul, no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), liderado pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), com tecnologias desenvolvidas por um dos ganhadores do Prêmio Nobel de Química 2024, David Baker.
O cientista foi laureado por seu trabalho inovador em design computacional de proteínas, um campo que ele ajudou a transformar de ideia marginal a tecnologia revolucionária.
Professor de bioquímica e diretor do Institute for Protein Design da Universidade de Washington, Baker compartilhou o prêmio com Demis Hassabis e John M. Jumper, ambos do Google DeepMind, por criarem proteínas que não existem na natureza, abrindo novas fronteiras para a biotecnologia.
O método pioneiro desenvolvido por Baker para projetar proteínas e prever suas estruturas tridimensionais é uma das diversas ferramentas utilizadas pelo INCT- Bioinspir da UCDB, que tem como foco a produção de pesquisas para o desenvolvimento de medicamentos “inspirados” em moléculas existentes na natureza, a partir de partículas encontradas na fauna e na flora brasileira.
Estruturado em um tripé básico de desenvolvimento de tecnologia, geração de produtos e formação de pessoal, o instituto conta com mais de 200 pesquisadores de 20 países trabalhando em conjunto e desde o início o Instituto conta apoio do Governo do Estado, via Fundect (Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul), vinculada à Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação) para o desenvolvimento de tecnologias que impactam, principalmente, nas cadeias produtivas de proteína animal, colocando Mato Grosso do Sul na vanguarda da pesquisa para produção de alimentos seguros e sustentáveis. Também participa do projeto o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“O Bioinspir mostra o poder da ciência colaborativa, trabalhada em rede, e coloca Mato Grosso do Sul no centro da pesquisa mundial. A bioinspiração mostra que as soluções estão na natureza e o Governo do Estado, via Fundect, vai investir ainda mais porque vemos nestas pesquisas um futuro para o país e para o Estado”, destaca Márcio de Araújo Pereira, diretor-presidente da Fundect.
Premiado com Nobel é parceiro da pesquisa realizada em MS
Octávio Luiz Franco, doutor e pesquisador que coordena os trabalhos no Bioinspir, se disse surpreso com a menção ao produto feita por Katy Perry, uma publicidade totalmente orgânica, segundo ele.
“O produto criado pelo nosso grupo de pesquisa, junto com a One Skin, é um dos primeiros do mundo baseados em peptídeos. A ideia foi criar um ‘míssil teleguiado’ com o peptídeo para atingir diretamente as células senescentes, características do envelhecimento, que tiram a flexibilidade na nossa pele. A molécula entra em contato com a pele e destroi apenas as células consideradas ruins. A Katy Perry com certeza está feliz com um rosto mais jovem”, finaliza o pesquisador.
Moléculas inspiradas
Na chamada bioinspiração os cientistas trabalham com moléculas que já estão na natureza e, a partir da análise de genomas, proteomas e afins, redesenham as moléculas utilizando técnicas de bioinformática que podem ter inteligência artificial, algoritmos genéticos, entre outras.
Para isso o INTC-Bioinspir criou um banco de dados de peptídeos com milhares de informações sobre plantas, animais e microrganismos, principalmente do Pantanal e do Cerrado, base para diversas pesquisas em andamento.
Até agora apenas duas moléculas resultaram em produtos viáveis. Uma é o peptídeo anti-idade da One Skin, já no mercado, e a outra é uma molécula para tratamento da mastite bovina, uma doença que causa a inflamação do tecido da glândula mamária das vacas e que mais provoca prejuízos econômicos na indústria de laticínios porque reduz a produção e a qualidade do leite. O produto está sendo desenvolvido em parceria com a OuroFino Saúde Animal.
Além destas, outras pesquisas estudam cicatrizantes para pets e humanos, moléculas para produção de frango, infecção hospitalar, resposta imune, cosméticos inteligentes e proteínas inteligentes.
Fotos: Divulgação Vogue; Oscar Frasser; Larissa Adami; One Skin