
Comportamentos desse tipo podem ser indicadores do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), problema neurobiológico de fundo genético que afeta de 3% a 5% das crianças e acompanha cerca de 50% delas ao longo da vida. Elas poderão sofrer com prejuízos de aprendizagem e sociabilidade e, quando adultos, ter mais dificuldade nos relacionamentos, no emprego, na vida social e atitudes impulsivas, que os tornam mais suscetíveis às drogas ou às doenças sexualmente transmissíveis, por exemplo. Um indivíduo com TDAH pode até ser brilhante em atividades que o atraem – se gostar de xadrez, por exemplo, vai se tornar um exímio jogador, mas possivelmente terá várias dificuldades relacionadas com o transtorno, com prejuízos para ele e, eventualmente, para as pessoas com as quais convive.
Relacionado a distúrbios de neurotransmissores como a dopamina e a noradrenalina, o TDAH afeta áreas do cérebro associadas ao autocontrole e à atenção. “O diagnóstico é clínico e tem de ser criterioso, envolvendo um levantamento cuidadoso do histórico da criança. Além dela e dos pais, às vezes precisamos conversar também com professores e outras pessoas da rede de relacionamentos da criança”, diz o Dr. Erasmo Casella, neurologista da infância e adolescência do Hospital Israelita Albert Einstein.
O passo inicial é a aplicação de um questionário simples, o SNAP-IV, baseado no Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Americana de Psiquiátrica, que avalia nove critérios de déficit de atenção e nove de hiperatividade e impulsividade. “A ocorrência de comportamentos associados a pelo menos seis desses critérios, por mais de seis meses, pode indicar TDAH e exige aprofundar as investigações clínicas”, afirma a Dra. Letícia Sampaio, também neurologista da infância e adolescência do Einstein.
Disponível na internet, em sites como o da Associação Brasileira do Déficit de Atenção (http://www.tdah.org.br/br/sobre-tdah/diagnostico-criancas.html), o questionário pode ser utilizado por pais e professores. Mas os resultados devem ser vistos apenas como sinalizador de um eventual transtorno. Quem faz o diagnóstico é o médico.
Antes de tudo, outras possibilidades devem ser descartadas. O comportamento inadequado pode derivar de problemas psicológicos, de situações de estresse, como uma morte na família ou a separação dos pais, ou simplesmente de má educação, caso, por exemplo, de crianças criadas sem a imposição de limites. Também é preciso descartar problemas de saúde que podem estar por trás de determinados comportamentos, como déficit de visão, audição, distúrbios do sono, dislexia, depressão e ansiedade, entre outros. No entanto, alguns desses problemas também podem ser comorbidades associadas ao TDAH. Até 70% das crianças com TDAH apresentam outros quadros associados.
O tratamento costuma envolver medicamentos estimulantes (há também medicamentos não estimulantes, mas são menos eficazes), além de terapia comportamental e aconselhamento familiar e escolar. Dependendo das dificuldades associadas, pode ser necessária, ainda, a atuação de outros profissionais, como fonoaudiólogo, psicopedagogo e psicomotricista.
É importante nunca rotular a criança como hiperativa ou algo parecido. Mas é preciso ajudá-la a entender que determinados comportamentos são inadequados, orientá-la, mostrar os limites e reconhecer ou elogiar as ações positivas. Os pais não devem gritar ou ter atitudes agressivas, pois os filhos são espelhos dos pais e agirão da mesma forma”, afirma o Dr. Erasmo. “Na escola, os professores também podem adotar iniciativas como colocar o aluno com TDAH na frente, permitir um tempo maior para que ele faça a prova e substituir uma tarefa de execução mais demorada por várias outras que possam ser realizadas mais rapidamente”, exemplifica a Dra. Letícia.
Por parte da família, dois erros básicos devem ser evitados. Um deles é achar que toda criança agitada tem TDAH. A maioria das que chegam ao consultório médico não tem. O outro erro vai na direção oposta: não reconhecer no filho comportamentos atípicos, achar que “fulano (hoje adulto) também era assim”, que “isso vai passar”, ignorar as reclamações da escola ou atribuir a falhas do professor as dificuldades de aprendizagem.
O melhor a fazer é consultar o pediatra que, se suspeitar do transtorno, encaminhará o caso para um especialista. Diagnóstico preciso e tratamento adequado são os melhores caminhos para enfrentar o TDAH e evitar os prejuízos que ele pode trazer na infância e, mais tarde, na vida adulta.
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