Segundo dados publicados pela Folha de São Paulo ("Demissões impulsionam ações na Justiça", 11.07.2016, Fernanda Perrin), "O número de processos recebidos nas varas trabalhistas brasileiras nunca foi tão alto. Em 2015, foram abertas 2,66 milhões de ações no paÃs, o maior número já registrado desde 1941, quando começa a série histórica do Tribunal Superior do Trabalho".
Já entre janeiro e abril deste ano, as varas receberam mais 905.670 processos, com alta de 7,9% ante igual perÃodo do ano anterior. Nesse ritmo, 2016 deve bater novo recorde de litÃgios na área.
A tendência acompanha o aumento do número de demissões em razão da crise econômica e do clima de incerteza. A taxa de desemprego está em 11,2% no trimestre móvel encerrado em maio, segundo o IBGE, com 11,4 milhões de pessoas em busca de um trabalho no paÃs.
Tem sido frequente o discurso de que para solucionar a crise econômica há necessidade de reforma trabalhista a fim de que as empresas possam retornar ao nÃvel de desenvolvimento e concomitantemente aumentar a empregabilidade. O argumento de fundo é sempre o mesmo: a legislação trabalhista ultrapassada que não
acompanha os novos modelos de relação de trabalho e que funciona como freio ao empreendedorismo e novos investimentos.
As notÃcias de reforma levaram o Judiciário Trabalhista, no intitulado "Documento em defesa do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho no Brasil", a apresentar manifestação contra suposto projeto ainda não definido, talvez nem esboçado, e que demonstra, pelos números elevadÃssimos de arrecadação em ações ajuizadas, mais a consequência de uma legislação de desproteção confirmados pela notÃcia da Folha de São Paulo.
Este fato significa a importância do Judiciário, todavia não revela que o Judiciário tenha colocado a efetiva reparação ao descumprimento da lei no seu devido lugar. Em palavras outras, a efetividade da proteção prevista em lei merece mais atenção, por meio de negociações locais, a fim de contenção da litigiosidade.
Manifestações desta natureza tendem a encontrar crÃticas e nem sempre espelham a vontade de todos que compõem o universo dos que representam, muito embora se apresentem como portadoras de consenso de uma classe. De qualquer forma, isto serve para demonstrar a que ponto nós chegamos quando se trata de preocupação na proteção trabalhista.
Em determinado trecho o manifesto assim se expressa: "Muitos aproveitam a fragilidade em que são jogados os trabalhadores em tempos de crise para desconstruir direitos, desregulamentar a legislação trabalhista, possibilitar a dispensa em massa, reduzir benefÃcios sociais, terceirizar e mitigar a responsabilidade social das empresas".
E, em outro trecho, criticam a possibilidade de remeter as questões trabalhistas ao campo das negociações e considera que este movimento deturpa o conceito da Constituição Federal, em seu artigo 7º, caput, "que é o de ampliar e melhorar as condições de trabalho".
De fato, não se pode aproveitar a crise para a supressão de direitos, mas também não se pode negar a importância das negociações coletivas em que os sindicatos podem desempenhar com legitimidade e representatividade a melhoria das condições sociais, nela considerada não o trabalhador na sua individualidade e sim o alcance da proteção social para os trabalhadores envolvidos nas negociações.
Temos que é inegável a necessidade de ajuste da legislação trabalhista com finalidade social e econômica, permitindo que empresas se adaptem na produção, no emprego e nas condições de trabalho.
Paulo Sérgio João é advogado, professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e da FGV. e-mail: [email protected]