Para muitas pessoas este acontecimento possa parecer sem importância. Se o fato for interpretado a partir do mundo das celebridades, diria que sim, mas o que se viu foi uma forte presença de Deus, apesar de uma celebração litúrgica muito singela.
As palavras dos Papas foram carregadas de simbolismos, simplicidade e espiritualidade. O Papa Francisco, quis pessoalmente expressar sua admiração e carinho pelo Papa emérito, Bento XVI. Suas palavras revelaram a dimensão da admiração do bispo de Roma pelo seu predecessor. Ao recordar a longa trajetória do Padre Joseph Ratzinger, hoje Bento, Francisco buscou nas Palavras de Jesus dirigidas a Pedro "Tu me amas?", motivos para salientar que este homem se fez sacerdote por amor, e por isso lhe foi confiado o pastoreio da Igreja em tantas ocasiões.
Reconheceu a grande contribuição acadêmica do Padre Ratzinger, que fez da teologia a "busca do amado". Por isso, disse Francisco: "E assim, precisamente vivendo e testemunhando hoje em modo tão intenso e luminoso esta única coisa realmente decisiva - tendo o olhar e o coração voltados a Deus - o senhor, Santidade, continua servindo a Igreja, não deixa de contribuir realmente com o vigor e a sabedoria para o crescimento dela". O pontífice salientou que o pequeno Mosteiro Mater Ecclesiae, dentro do Vaticano, lugar simples e despojado, onde vive o emérito, revela o coração de Bento, tornando-se inspiração também para Francisco que tomou este nome em homenagem ao santo da simplicidade. O Convento onde vive Bento, segundo Francisco, é um lugar que "emana uma tranquilidade, uma paz, uma força, uma confiança, uma maturidade, uma fé, uma dedicação e uma fidelidade que me fazem tão bem e dão força para mim e para toda a Igreja". Não é o convento em si que transmite paz e tranquilidade, mas quem nele vive.
Surpreendentemente Bento XVI, de improviso, apesar dos seus quase 90 anos de idade, dirigiu aos presentes algumas palavras, mostrando uma imensa lucidez e paz interior. Ao agradecer ao Papa atual, o emérito disse: "obrigado especialmente ao senhor, Santo Padre! A sua bondade, desde o primeiro momento da sua eleição, em cada momento da minha vida aqui, me toca, realmente e me eleva interiormente. Mais do que nos Jardins do Vaticano, com a sua beleza, a Sua bondade, é o lugar onde eu moro: Sinto-me protegido".
A força interior e a espiritualidade deste homem impressionam, não é o lugar físico que lhe faz bem, não são os muros do Vaticano que o protegem, mas a presença de Pedro, outrora representado nele mesmo e agora em Francisco, que se tornou o lugar de alegria do homem que na Igreja provocou uma revolução, não porque criou grandes estruturas, mas pelo amor a Deus, especialmente revelado ao deixar o cargo que para muitos representa poder, para ele, no entanto, é somente serviço. Visível e claro: não são as falsas seguranças que o instigam a viver.
A demonstração da maturidade de fé foi palpável nas comemorações deste evento de grande expressão espiritual, e ao mesmo tempo, socialmente tão singelo. O ocorrido revela uma faceta maravilhosa da Igreja de Cristo, que faz brotar a face do serviço, do amor ao SENHOR. No coração destes dois homens não existe lugar para a disputa de poder, Deus é a única causa que os movem.
Roma, porém, não está distante de nós, lá convivem dois bispos, o emérito e o titular, aqui vemos também a convivência fraterna e harmoniosa dos nossos dois bispos, Dom Redovino, nosso emérito e Dom Henrique, no exercício do governo da diocese, que acolhe e cuida daquele que ofereceu sua vida em oblação nos últimos 15 anos à frente da Igreja Católica de Dourados.
Que estes modelos sejam para todos, exemplos de que o poder só realiza quando exercido com amor e espírito de desprendimento. Como Bento, sejamos disponíveis para receber a novidade da vida (Deus) e ajudar para a transubstanciação do mundo: "um mundo não de morte, mas de vida; um mundo em que o amor venceu a morte".
Pároco da Catedral de Dourados, MS. e-mail: [email protected]