No meu caso, o medo acabou certa vez que viajando sozinho para Ponta Porã (para isso eu já era homem como todos os meninos das fazendas) e por não pedir pousada nas casas, afastava-me para longe da estrada, buscava árvore ou arbusto forte para amarrar o cavalo na soga e ali, com o pelego e o "serigote" fazia a cama e dormia (medo só de alma do outro mundo).
Nessa viagem já estava ficando escuro quando resolvi parar. Afastei-me da estrada de modo a não ser visto no escuro, campo limpo, saí batendo com os pés de um lado e de outro até que encontrei uma estaca. Que beleza! Uma estaca!
Desarreei o cavalo (aliás era uma mulinha branca) e a amarrei na soga. Como era um campo limpo fiz minha cama e dormi um sono de criança sem medo e cansada.
Quando acordei pela manhã encontrei, no meio da macega, um pedaço de sarrafo. Era a trave da cruz, a estaca em que amarrara a mula. Dormi em cima de um defunto e não vi nenhuma alma do outro mundo e o único medo acabou. E muitos de minha família não tinham medo. Agora é estranho falar nisso, mas ninguém tinha documento e onde caia morto era enterrado e punham a cruz. que, então, eram encontradas por toda parte.
E nisto lembremos a vontade. Esta é que comanda o ter ou não ter medo. Covarde é em quem o medo é maior do que a força de vontade e corajoso é aquele no qual a força de vontade sobrepõe-se ao medo. Aliás o natural é ter medo que representa o atavismo da preservação da vida.
Força de vontade. Grande virtude. Pode-se desenvolvê-la com treinamento, tal como o de suportar dores e decepções de todo tipo, sem nada demonstrar. Manter, em qualquer circunstância, a fisionomia do bem estar e, também, nunca desistir quando se propuser a realizar algo importante. Mas, muitos consideram teimosia, ou seja, defeito.
Médico. Escreve às quartas-feiras.
Médico. Escreve às quartas-feiras. e-mail: [email protected]