Saúde

Projeto de pesquisa busca aferir os índices de dores lombares na população negra brasileira

O estudo busca interessados em participar do levantamento; experimento prevê o tratamento por métodos de telerreabilitação

6 ABR 2024 • POR Jornal da USP • 08h00
Pesquisa vai realizar ensaios clínicos com foco na população negra acometida por dor lombar crônica inespecífica - Freepik

Um estudo aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Medicina (FM) da USP está recrutando voluntários, entre a população negra brasileira, acometidos por dor lombar crônica inespecífica para tratamento por meio do uso da telerreabilitação. A pesquisa faz parte do doutorado da fisioterapeuta Merllin de Souza, que vem realizando seus estudos no Programa de Pós-Graduação de Ciências da Reabilitação do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional (Fofito) da FM da USP. A pesquisa, intitulada Efeito do uso de telerreabilitação na dor lombar crônica inespecífica da população negra: um ensaio clínico controlado aleatorizado, conta com a orientação da professora Amélia Pasqual Marques.

Merllin de Souza – Foto: Arquivo pessoal

 

Em entrevista ao Jornal da USP, Merllin explica a principal razão para a escolha do tema da pesquisa, que é um ensaio clínico com foco na população negra: “É uma forma que encontramos de contribuir na área de fisioterapia e integrar com a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra.” A política, como descreve a pesquisadora, foi instituída pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria nº 992, de 13 de maio de 2009, apresentando como marca o reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do racismo institucional como determinantes sociais das condições de saúde. “É preciso promover a equidade em saúde”, enfatiza Merllin. “Outra preocupação é a nossa contribuição com o que prevê o Estatuto de Igualdade Racial, pela Lei 12.288, de 20 de julho de 2010, que tem como um de seus objetivos fomentar a realização de estudos e pesquisas sobre racismo e saúde da população negra.”

A primeira etapa de seu estudo, concluída em junho de 2023, consistiu em validar o protocolo de pesquisa. “Foi quando delimitamos que o estudo seria feito em pessoas que integram a população negra e o que, de fato, seria objeto de nossa pesquisa, que é a dor lombar crônica inespecífica nesta população e o uso da ferramenta de telerreabilitação”, explica a fisioterapeuta.

Nesta segunda etapa, a pesquisadora está em fase de coleta de dados. “Estamos também já na intervenção com o tratamento e continuamos a recrutar pessoas”, diz. A expectativa da fisioterapeuta é concluir seu estudo ainda este ano. Ela não informou quantos voluntários já foram recrutados. Numa terceira etapa do estudo, haverá novas análises e as pessoas serão divididas em grupos controle e experimental. “Ao todo, pretendemos reunir até 102 pessoas para testar nossa hipótese”, contabiliza Merllin.

Dor lombar

Como descreve a fisioterapeuta, a dor lombar pode resultar de várias anormalidades ou agravos de saúde diferentes. “É geralmente acompanhada de presença de dor em um ou em ambos os membros inferiores (pernas), entre as margens inferiores das últimas costelas e na região dos glúteos.”

Em quase 90% dos casos, como descreve Merllin, as dores lombares são por causas inespecíficas, ou seja, não ocorrem por causa de um acidente, ou lesão direta, por exemplo. “Para a comunidade científica que estuda esse sintoma, a maioria da população adulta terá a presença de dor lombar em algum momento da vida”, estima a pesquisadora.

A dor lombar é uma condição complexa e com múltiplos contribuintes tanto para a dor como para a incapacidade associada, incluindo fatores psicológicos, sociais, biofísicos, comorbidades e mecanismos de processamento da dor.

E quando se destaca o impacto financeiro, é observado que é intersetorial, porque aumenta os custos tanto nos sistemas de cuidados de saúde como nos sistemas de apoio social. Contudo, a dor lombar não tem estado no centro dos programas de saúde pública, especialmente em países de baixo e médio desenvolvimento.

Amélia Pasqual Marques – Foto: Arquivo pessoal

 

“Diante disso decidimos incluir a telerreabilitação como uma ferramenta em nosso estudo”, justifica a pesquisadora. Ela explica que a telerreabilitação é o uso de um conjunto de recursos e tecnologias de informação e comunicação que possibilitam o processo de reabilitação a distância com propósitos de melhorar os serviços e aumentar a capacidade e a acessibilidade aos tratamentos para o processo de reabilitação.

E quando se pensa em sua configuração, foi desenvolvida para que possa proporcionar acesso reconhecendo que todas as pessoas precisam de atenção, mas não necessariamente dos mesmos atendimentos. Caso possuam algum impedimento para acessar os serviços de saúde, seja por questões de distância geográfica, barreiras físicas ou socioeconômicas, a terapia se torna viável, se bem utilizada. “Mas, no Brasil, ainda precisamos estudar e compreender todos os aspectos envolvidos nas boas práticas deste recurso, afinal, o País possui dimensões continentais e diversidades culturais”, destaca.

Ubu-ntu

Merllin conta que a equipe optou por fazer a junção da telerreabilitação com a filosofia Ubu-ntu (“eu sou porque nós somos”), pois vem de encontro a poder proporcionar uma experiência aos participantes que seja afrocentrada, ou seja, em “toda a abordagem de avaliação e reavaliação, a pesquisadora prescreverá os atendimentos, plataforma de prescrição do protocolo de tratamento baseado em exercícios e abordagem educativa e desenvolvida e validada por pessoas negras da área da saúde”.

As pessoas que participarem receberão 12 sessões de tratamento fisioterapêutico por meio da telerreabilitação, três vezes por semana, e poderão entrar em contato com a equipe da pesquisa a qualquer momento. Merllin destaca ainda que a pesquisa recebe o apoio da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Os interessados em participar devem atender aos seguintes pré-requisitos:
• A população-alvo são pessoas autodeclaradas negras (pretas ou pardas) segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística;
• Apresentar dor lombar;
• Idade de 18 a 65 anos;
• Não estar em período de gestação;
• Morar no Brasil;
• Possuir um celular ou computador com acesso à internet.

Para participar da pesquisa preencha o questionário de triagem pelo link https://redcap.link/dorlombarpopnegra.

 

Mais informações: ingred.merllin@fm.usp.br