Dia das Mães

Adoção: ‘Gestação’ é mais longa para as mães do coração

8 MAI 2021 • POR Cristina Nunes • 09h49
Marli de Oliveira presidente do Grupo de Apoio à Adoção em Dourados - Divulgação

Diferente das mães biológicas que esperam por um período de nove meses para terem o filho nos braços, as mães do coração sofrem com uma espera maior, isso porque o processo de adoção é demorado no Brasil. De acordo com dados da Vara da Infância e Juventude da comarca de Dourados, 34 casais ainda aguardam na fila no município.

Em entrevista ao PROGRESSO o juiz Eduardo Floriano explicou que o processo não é rápido. "Nem todas as crianças e adolescentes que estão nos abrigos já podem ir para um novo lar. Antes da adoção, se percorre um longo caminho no processo de Destituição do Poder Familiar. O Juiz tem que estar muito bem embasado para tomar a decisão de extinção do poder familiar biológico. Por isso, geralmente ocorre em situações em que não há mais volta, onde não foi possível haver uma reestruturação familiar e nem o interesse de parentes pela guarda das crianças e adolescentes. Além disso, é preciso ouvir uma série de depoimentos e preservar o direito de defesa dos pais biológicos", afirmou o magistrado.

"Nesses casos, quando o juiz toma a decisão de Destituição do Poder Familiar é porque o trauma de ser tirado do convívio da família biológica terá efeito menor do que perdurar-se a situação em que a criança está. É preciso elementos fortes para que no futuro não haja devolução aos pais", explicou Eduardo. O juiz explicou ainda que o processo é mais rápido quando a mãe decide por vontade própria entregar a criança à Justiça, isso pode ser feito durante a gestação ou logo após o parto.

Dourados tem rede de apoio para quem deseja adotar

Desde 2011 o município conta com o GAAD ‘Acolher´ (Grupo de Apoio à Adoção em Dourados) que desenvolve um trabalho junto a comunidade auxiliando pessoas que pretendem adotar, bem como atendendo também as entidades que acolhem crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade.

Em entrevista ao PROGRESSO, a advogada Marli de Oliveira, presidente do GAAD, destacou a grandeza daquelas que decidem gerar com o coração e falou sobre os desafios de quem aguarda na fila de adoção. "Existe mais de uma forma de gerar um filho e uma delas é gerar pelo coração. A mãe biológica espera nove meses, no caso das mães do coração essa espera pode durar um, dois, três, quatro anos. São várias fases até a criança chegar e você ver os rostinho dela. Como qualquer outra mãe, elas sofrem as angustias próprias de uma espera: a ansiedade, escolha do enxoval, ou seja, a única coisa que muda é a forma de gerar, mas o desenvolver do amor é igual. O amor transcende a genética, esse é o lema do GAAD", destacou Marli.

Casal supera barreiras e realiza sonho da adoção em Dourados

Nas vésperas do Dia das Mães o PROGRESSO entrevistou a recrutadora Nislley Lara, de 38 anos, que adotou os adolescentes Julia, de 15 anos e Tom de 14. Ela afirmou que a adoção era um sonha antigo. "Era algo que sempre esteve presente no meu coração, pois fui criada quando criança com um tio adotivo, minha avó adotou ele, nós temos a mesma idade", afirmou Nislley.

Ela conta que conheceu a filha adotiva durante um projeto social. "Nossa aproximação foi por causa de um projeto chamado Borboletas, na qual eu era a líder e idealizadora com mais algumas amigas, fazíamos visitas no lar e oferecíamos cursos profissionalizantes para as meninas em situação de acolhimento no Lar Renascer (uma casa de acolhimento municipal que foi fechada). Quando conheci a Julia, não havia interesse em adoção, inclusive ela não estava disponível", explicou.

"A história dela durante o projeto mudou, não havia mais interesse do pai biológico em ficar com ela, a mãe já era falecida, e ela sentia muita saudade de casa e do irmão mais novo, o Tom, que estava com o pai ainda, e por causa da tristeza que ela sentia e demonstrava comecei me aproximar e ficamos amigas. Com apoio da coordenadora do Lar eu tive autorização para levar a menina em casa para passear e passar o fim de semana".

Nislley relatou que ao conversar com a coordenadora do lar na época, foi informada que não havia interesse mais da família biológica, então ela e o esposo decidiram que queriam adotar. "Fomos atrás da história da família para saber se o pai biológico estava disposto a entregar ela para adoção, ele disse que sim, pois ele não conseguia criar vínculo afetivo com ela e com o Tom, que na época que não estava no abrigo, estava morando com ele. O pai biológico quis que nós também adotássemos o Tom.", contou.

A mãe adotiva disse que mesmo o pai afirmando que queria abrir mão dos filhos biológicos, o processo foi um pouco longo e dolorido devido a burocracia existente, mas no final tudo deu certo e hoje ela comemora a conquista de se tornar uma mãe do coração. "O processo de adoção de adolescentes tem essa possibilidade da escolha e isso em nossa relação contribui muito para que possamos sempre ficar bem em família. É claro que existem desafios, mas não é diferente dos que tivemos quando nós éramos adolescentes, naturalizar a adoção, falar sobre, dar espaço para as histórias e a família que veio antes de nós é essencial para que o nosso presente e futuro seja melhor", finalizou Nislley.