DIA DO ORGULHO LGBT

Pessoas LGBT+ de Dourados lutam todos os dias por mais respeito e visibilidade

28 JUN 2018 • POR • 13h48
Em 2017, 445 lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBTs) foram mortos em crimes motivados por homofobia. O número representa uma vítima a cada 19 horas. O dado está em levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), que registrou o maior número de casos de morte relacionados à homofobia desde que o monitoramento anual começou a ser elaborado pela entidade, há 38 anos. Os dados de 2017 representam um aumento de 30% em relação a 2016, quando foram registrados 343 casos. Em 2015 foram 319 LGBTs assassinados, contra 320 em 2014 e 314 em 2013. O saldo de crimes violentos contra essa população em 2017 é três vezes maior do que o observado há 10 anos, quando foram identificados 142 casos. Até 15 de maio deste ano, ao menos 153 pessoas LGBTs morreram no Brasil, vítimas de preconceito contra a identidade de gênero e contra a orientação sexual. Diante desses dados estarrecedores perguntamos "como é ser uma Pessoa LGBT em Dourados", a cidade tem um pouco mais de 200 mil habitantes ainda há muito pensamento conservador da população, muita gente enxerga a comunidade LGBT+ com preconceito e, em muitos casos, discriminação. Conversamos com A.S.P.,16, e Nosli, 49, duas gerações de pessoas LGBT+ que tem em comum a discriminação, preconceito e o medo dos outros por serem quem são, poderíamos contextualizar suas falas neste texto, mas preferimos transcrevê-los, para que uma mensagem de empatia nesse 28 de junho, Dia do Orgulho LGBT chegue a todos. Nosli Eu sou Nosli Melissa, 49 anos mulher transexual, funcionária pública do Estado MS e sou transativista (luto pelos direitos das pessoas Trans no nosso Estado). É muito difícil ser LGBT em sua cidade pequena e conservadora como a nossa. Tanto que a maioria arrasadora dos homossexuais e lésbicas estão em seus "armários" protegidos pelo anonimato porque se assumirem é certeza de sofrer discriminação, violação de direitos, exclusão dentro da família, na escola, nos círculos sociais de amizade e sobretudo no Mercado de formal de trabalho! E quando falamos de pessoas travestis/transexuais, vamos perceber que é o segmento mais discriminado, mais estigmatizado dentro da sociedade! O processo de exclusão das travestis começa cedo. Aos 12/13 anos quando elas externalizam sua identidade feminina, que não é fruto de uma mera escolha inconsequente, o caminho usado pela família é a " violência". E pra fugir das surras e espancamentos acabam saindo de casa e vão parar nas ruas, sem estudo, não chegam ao mercado de trabalho, que é hostil pras travestis e transexuais. Desse modo acabam parando na prostituição e lá se põem em condição vulnerabilidade porque nesses espaços circulam os piores tipos de pessoas (cafetões, bandidos, assassinos, gangues), que numa dessas acabam assassinando-as sem dó nem piedade. Eu não fui expulsa de casa, isso não significa que fui aceita. Fui tolerada! Essa tolerância me permitiu estudar e me graduar em pedagogia, construir uma rede de sociabilidade que me ajudou a chegar no mercado de trabalho. Quando me assumi, fui taxada dentro da família, de pervertida, me levaram a tratamento destinados à cura (igreja e psicólogos). Nada disso deu certo porque não sou doente e nem pervertida, sou apenas diferente e vivo numa sociedade que não sabe lidar com minha diferença. Essa violência fez com que eu não levasse adiante meu processo de transição, quando conquistei minha emancipação e autonomia me senti segura e me transicionei. Mas não sou regra, eu tenho consciência que dei sorte, sou privilegiada porque a maioria arrasadora das minhas iguais são expulsas assim que começam a performar sua feminilidade. Hoje em dia não sou mais discriminada dentro da família, ainda não sou aceita como gostaria, mas tenho o respeito de todos. Sobre minha orientação sexual, percebo que dentro da sociedade existe uma confusão com a identidade de gênero e orientação sexual. Os dois campos não se misturam! Se sou uma mulher transexual, reconhecida registralmente e juridicamente como mulher sujeita de direitos pelo meu país e minha orientação sexual ( meu desejo, meu afeto, ) está voltado aos homens, então sou uma mulher transexual heterossexual, porque me relaciono com um oposto de mim e não um igual. Não somos homossexuais de vestido, somos mulheres transexuais, sofremos com machismo, misoginia como toda mulher nessa sociedade. O que temos em comum com os homossexuais é muita disposição para combater tanto a homofobia como a transfobia! A maior barreira que enfrentei foi no mercado de trabalho, estudei fiz cursos de qualificações e quando fui procurar emprego na cidade, fui muito discriminada. Não se dá emprego para travesti e transexual em nossa cidade. Parece-me que não temos direitos à luz do dia. Ser uma mulher trans ou uma travesti, é prerrogativa para rasgarem o currículo na nossa cara. Algo que me marcou muito nas minhas tentativas de conseguir emprego, foi quando me qualifiquei como técnica em enfermagem e fui procurar emprego. Em um hospital da cidade me disseram que não poderiam me contratar por que a direção do hospital era evangélica. Argumentei dizendo, que era um motivo a mais para me darem uma oportunidade, pois Cristo ensina nos 4 livros do evangelho que temos que acolher os discriminados. Não teve jeito, não olharam para minha capacidade técnica e sim pela minha diferença. Dói muito isso tudo, deixam marcas que levaremos para sempre. Hoje, sou concursada, tenho estabilidade, mas sei, que sei que se tivesse sido expulsa de casa , não chegaria aqui, sou uma SOBREVIVENTE. Quero aproveitar a oportunidade para dizer as famílias, que não expulsem seus filhos trans de casa, acolhem, não porque somos trans que deixamos de ser seus filhos! A transfobia em nada nos atinge quando podemos contar com o pilar que nos sustenta na vida que é a família! A.S.P. A. S. P., 16 anos, gay/homossexual. Ser LGBT em Dourados é um desafio. Nossa cidade é bem conservadora quando se trata do assunto LGBT. Muitas vezes aparecem notícias de pessoas LGBT assassinadas ou agredidas, e o grupo que mais sofre com essa repressão são os jovens que muitas vezes se veem discriminados pela própria família e ou escola. Eu mesmo já senti o efeito do conservadorismo da família ao descobrirem que eu sou gay. Sem contar os desabafos de amigos que tem a idade parecida com a minha. Ser gay na adolescência é uma problemática muito grande. Temos que lidar com o preconceito muito cedo e por isso, muitos preferem se esconder atrás de uma verdade que não é a realidade. . Muitas vezes, me senti discriminado em vários lugares aqui em Dourados. Sinto os olhares maldosos e sedentos de julgamento. Numa noite estava eu voltando para casa quando passei por uma rua e haviam dois homens aparentemente embriagados. Eles me olharam e disseram coisas do tipo: "Eu não gosto de viado. É uma pouca vergonha! E se achar ruim, a gente desce a porrada". Nessa noite, eu pensei que iria apanhar ou até mesmo ser morto. Foi a primeira vez que me senti indefeso por ser LGBT. Eu espero um dia poder andar nas ruas de mãos dadas com meu namorado sem alguém olhar feio ou falar coisas agressivas. Eu espero que as pessoas aprendam sobre o amor incondicional. Esses depoimentos mostram duas gerações que vivem em nossa cidade e só pedem respeito, nada além disso e que toda a população aprenda, um pouco no dia a dia, a respeitar as diferenças.