Editorial

Retrato da inadimplência

11 DEZ 2015 • POR • 10h33
A Serasa divulgou pesquisa ontem confirmando o que todo conjunto da sociedade já está cansado de saber: o desemprego é o principal motivo da inadimplência dos brasileiros. Neste cenário, 26% dos 8.288 consumidores entrevistados apontaram que a perda do emprego é a explicação para as contas atrasadas, enquanto outros 17% admitiram que não estão conseguindo honrar os compromissos em virtude do descontrole financeiro. Essa situação é crítica, uma vez que a inadimplência das famílias brasileiras vinha aumentando nos últimos anos, mesmo com os níveis de empregos se mantendo em alta, ou seja, com a elevação das taxas de desemprego nas principais regiões metropolitanas do Brasil, é muito provável que o volume de pessoas em dificuldade para pagar as contas se eleve de forma considerável no primeiro trimestre de 2016. Informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho mostram que outubro foi o sétimo mês seguido de fechamento de vagas formais, quando o Brasil perdeu 169.131 postos de trabalho e teve a menor geração de empregos para o período desde 1992, ano de início da série histórica.


O levantamento realizado pela Serasa confirma a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), apontando que o endividamento das famílias, em novembro, chegou a 68,6%, ou seja, para cada grupo de 100 famílias, quase de 69 estão endividadas. O volume também cresceu na comparação anual, ficando 9,7 pontos percentuais acima dos 57,6% observados em novembro de 2014, de forma que, em 2013, as famílias brasileiras estão devendo mais. O mais preocupante é que o percentual de famílias com dívidas ou contas em atraso, ou inadimplentes, aumentou 28,7% tanto em relação ao mês anterior como na comparação com o mesmo período de 2014, se configurando o maior percentual nos últimos 12 meses. São números que servem de alerta para o mercado varejista e atacadista, já que, endividadas, essas famílias não terão como contrair novas dívidas até solucionar a situação atual, indicando uma possível recessão no curto prazo, o que pode impactar de forma negativa as tradicionais vendas de final de ano.


Os números da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo revelam, ainda, que a proporção das famílias que se declararam muito endividadas aumentou pelo décimo mês consecutivo, alcançando 15,7% do total, enquanto o percentual de famílias que declararam não ter condições de pagar suas contas, ou dívidas em atraso, ficou em 15,7% em novembro. A quase totalidade das famílias endividadas teve problemas com cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, empréstimo, prestação de carro e seguro, mas a modalidade cartão de crédito foi disparado o principal tipo de dívida, penalizando 75,2% das famílias, número muito superior ao de carnês, que respondeu por 17,9% do total. A Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor confirma o indicador Serasa Experian, que tem apontado aumento considerável no volume de cheques devolvidos por falta de fundos em todo o Brasil, tanto que mais de 1,7 milhão de cheques não foram pagos apenas no mês de novembro, confirmando a tendência de um 2016 difícil para o comércio varejista e atacadista.


Para variar, as dívidas contraídas com os bancos lideraram o ranking da inadimplência com aumento de 11,7% neste ano, ou seja, quem tomou dinheiro emprestado não está conseguindo pagar as parcelas e essa situação deve gerar um efeito cascata que acabará contaminando todo o sistema financeiro. Significa dizer que, num primeiro momento, os bancos ficarão mais cuidadosos na hora de aprovar qualquer pedido de empréstimo, sobretudo na modalidade Crédito Direto ao Consumidor (CDC) e, num segundo momento, os juros devem ficar ainda maiores para compensar os riscos desse tipo de operação financeira, de forma que a conta acabará sendo paga justamente pelo consumidor. Além dos empréstimos bancários, as operações com financeiras, lojas em geral e prestadoras de serviços, como telefonia e fornecimento de energia elétrica e água, também estão sofrendo com o calote, tanto que a inadimplência aumentou 14,7% neste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. O sinal de alerta foi ligado, mesmo porque nada retrata mais a crise financeira de uma sociedade que a inadimplência do consumidor.