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Entrevista

Falta de matéria-prima pode paralisar obras da construção civil

Entrevista · Carlos Alberto Vitoratti - Economista

12 Abr 2021 - 13h01Por Rozembergue Marques
Carlos Alberto Vitoratti é economista - Crédito: DivulgaçãoCarlos Alberto Vitoratti é economista - Crédito: Divulgação

De um lado, tem-se o fato de que estão faltando elementos de construção como materiais ferrosos, aço, fios elétricos, cimento e materiais de acabamento. E, do outro, tem-se o fato, ainda mais grave, de que a falta de produtos leva ao aumento vertiginoso de preços.

Em Dourados, o economista Carlos Alberto Vitoratti explica que no caso do aço e dos materiais ferrosos, por exemplo, tem-se um aumento de preços de mais de 64% em período tão curto de tempo. Nos outros casos, sempre as verificações demonstram ocorrências que superam os 20%. E, o fenômeno se espalhou para outros setores importantes como a indústria de pneus, de peças e componentes, de plásticos e de eletroeletrônicos. Em entrevista ao O PROGRESSO, o economista avalia ainda os efeitos da pandemia na economia.

Como você avalia a economia mundial e nacional desde o início da pandemia até hoje?

É preciso que partamos do pressuposto de que os tempos da pandemia são distintos e diferenciados entre si. O processo todo se iniciou na China, mais precisamente em Wuhan, no final de 2019. Com a paralisação do parque industrial chinês, há uma consequência da diminuição de ritmo de produção na economia mundial, visto que a China é exportadora de algo em torno de 24% de tudo o que é importado no mundo. E, o mais grave é que boa parte das exportações chinesas são de peças, matérias-primas e componentes, que são vitais para a indústria do restante do mundo. Então, como já frisei, a paralisação da indústria chinesa implicou em diminuição dos estoques de produtos acabados em todos os outros centros industriais do mundo.

No caso brasileiro, quando se deu o fechamento quase total das atividades industriais e comerciais, entre março e abril de 2020, aconteceu o fenômeno do fechamento das empresas com estoques quase zero. Quando houve uma retomada das atividades econômicas, no segundo semestre de 2020, as indústrias e as empresas comerciais foram pegas em situação de atendimento sem estoques e aí houve falta de produtos no mercado. E, neste caso, não há como impedir que aumentos muito significativos de preços aconteçam.

Então, mais do que econômico, o problema foi científico e sanitário. A ciência foi pega de forma totalmente desprevenida por nova doença, de capacidade de infecção sem igual e sem saber como enfrentá-la. Distanciamento social e isolamento não são profilaxias de combate à doença. São meras formas de se ganhar tempo. Então, o que se fez foi paralisar a economia para se achatar a curva de contágio. Só que nós, os economistas, avisamos, desde o começo, que a conta da paralisação viria. E, veio, infelizmente, na forma do agravamento da pobreza e na volta da miserabilidade absoluta.

O que aconteceu, de forma bem simplista, para que todos entendam é que a humanidade foi pega de surpresa por um vírus animal que se adaptou aos seres humanos e nestes se mostrou letal e, a economia pagou o preço deste despreparo. E, a equação, qualquer que seja o ponto de vista de análise tem sempre a mesma resposta de finalização. O afetamento da vida, seja pela doença, seja pela fome.

Quais os reais efeitos da pandemia sobre a economia e quais os setores mais afetados?

A conta da surpresa foi e será absolutamente salgada. Setores importantes como a construção civil, que é o maior empregador de mão-de-obra urbana do Brasil serão paralisados. E, a paralisação se dará por 02 (dois) fatores igualmente desastrosos, que se auto-alimentam. De um lado, tem-se o fato de que estão faltando elementos de construção como materiais ferrosos, aço, fios elétricos, cimento e materiais de acabamento. E, do outro, tem-se o fato, ainda mais grave, de que a falta de produtos leva ao aumento vertiginoso de preços. No caso do aço e dos materiais ferrosos, por exemplo, tem-se um aumento de preços de mais de 64% em período tão curto de tempo. Nos outros casos, sempre as verificações demonstram ocorrências que superam os 20%. E, o fenômeno se espalhou para outros setores importantes como a indústria de pneus, de peças e componentes, de plásticos e de eletroeletrônicos.

E, o que mais chama à atenção é que os efeitos das paralisações econômicas, ao redor do mundo, não desarticularam somente a economia brasileira. Os efeitos são mundiais. E, já se sabe que indústrias importantes como as de construção, turismo e bens de tecnologia levarão, ao menos, mais 05 (cinco) anos para que se consiga retomar os níveis de atuação que se tinha em 2019. E, nem se está falando de aumentos de produção, mas apenas e tão somente de recuperação do que se tinha em 2019.

E, é preciso que se destaque as consequências do quadro ora descrito. O mundo conviverá com um desemprego gigantesco, de mais ou menos 500 milhões de pessoas, com uma diminuição da renda mundial, em torno dos 6,5%. Ou seja, mais do que nunca os organismos internacionais terão que ter um papel ativo e fundamental para o combate à grande consequência, que ainda pouco apareceu: a fome no mundo.  

No Brasil, os próximos 24/30 meses serão de fechamento de inúmeras micros e pequenas empresas e de aumento ainda mais expressivo do desemprego.

Quais as consequências para outros setores da economia, já que a maior parte da logística interna de insumos, alimentos, medicamentos e produtos em geral no Brasil é feita por rodovias?

A questão nem é tanto a do modal de transportes que o país utiliza. A questão é a capacidade de retomada da atividade econômica. Vai ser preciso que o governo se utilize dos bancos como o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BASA – Banco da Amazônia S/A, Banco do Nordeste, BRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul e da Caixa Econômica Federal para fazer empréstimos de criação e de consolidação de negócios. E, se possível, com longos prazos para pagamento e, até, com juros zero. O país precisará recuperar bares, restaurantes, empresas de turismo, hotéis, empresas de eventos, unidades de lazer, beleza e entretenimento para que se volte a gerar empregos. E, mesmo assim, haverá dificuldades porque a pandemia está levando cérebros muito importantes, quase insubstituíveis. Infelizmente, o quadro é bem mais grave do que o que aparenta, neste momento.

Quais as lições a serem extraídas da pandemia por parte da economia brasileira?

Isto nós ainda vamos ter que aguardar um pouco mais para perceber. É agora que nós vamos ver o quanto o país e a sua gente são deveras inteligentes.

O problema é que ao invés de procurar alternativas de saídas, nós estamos procurando culpados para os problemas. A grande imprensa nacional está fazendo um estardalhaço porque o país ainda vacinou menos de 15% de sua população. Só que eles se esquecem de dizer que o Japão ainda não vacinou 2% da sua. Só que no Japão, as pessoas não se cumprimentam com 03 (três) beijinhos, as pessoas não se aglomeram para festas de família com mais de 200 (duzentas) participantes, as pessoas moram bem e cuidam muito de sua higiene pessoal. Então, o momento é de interação nacional e de mudança de comportamentos. É isto que importa.

Então, ao invés de se ficar discutindo o hoje, o agora, o presente, nós precisamos começar uma discussão muito séria e muito profunda sobre o futuro. Ficou muito evidente que o sistema de saúde do país é maravilhoso e competente. Mas, ele é limitado. Então, é preciso pensar melhor na sua ocupação futura. É preciso que ele seja gerido com muito mais racionalidade e competência. A mesma coisa se pode dizer da estrutura produtiva do país. Mas, é preciso que ela seja menos tributada e mais protegida, para que o brasileiro opere com preços reais e, por conta disso, possa dar preferência para os produtos produzidos no país. E, é preciso fazer-se uma campanha de conscientização em favor dos produtos nacionais. É preciso que as pessoas saibam que quando compram um produto importado, elas estão exportando empregos. Mas, para fazer isto, é urgente uma reforma tributária que, a partir da liberalização e da tributação dos jogos de azar, deixe de tributar a produção, coisa que o restante do mundo já não faz, há muito tempo.

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