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Ausência do ritual de despedida na pandemia afeta o luto

Em entrevista, psicóloga avalia impactos negativos da pandemia nas mudanças de velórios e enterros

05 Nov 2020 - 13h26Por Gracindo Ramos, Especial para O Progresso
Ausência do ritual de despedida na pandemia afeta o luto - Crédito: Divulgação Crédito: Divulgação

Muitas pessoas não têm conseguido se despedir dos seus entes queridos devido aos protocolos dos velórios e enterros durante a pandemia. E aqueles familiares e amigos que moram em outras cidades e estados não conseguem chegar a tempo para o ritual de despedida. Para Ticiana Araujo da Silva, “isso é algo que, com certeza, vai fazer alguma diferença dentro desse processo de enlutamento”. A professora universitária psicanalista e doutora em psicologia explica que esse ritual de passagem é um marco e importante enquanto processo civilizatório, assim como o nascimento e o casamento. Esses marcos simbólicos ajudam na compreensão e na forma como lidamos com esses acontecimentos. “Como o ritual nos ajuda a compreender o processo e, de certa forma, aceitá-los, a ausência desses rituais pode ser negativa. Porque é como se a gente não tivesse se despedido daquela pessoa, não pudesse ter dito adeus e isso pode vir a ter um impacto negativo”, diz.

“Eu acho que o mais difícil nesse processo de elaboração de luto é a impossibilidade da despedida. A maioria das pessoas que morrem, morrem sozinhas, isoladas. E até o processo de despedida dessas pessoas é impactada, porque não há possibilidade de um velório nos moldes que nós fazíamos anteriormente e não há a despedida dos familiares e isso é uma questão profundamente complicada e sensível”, avalia. Lidar com a perda ainda é desafio para nós. A psicóloga lembra que, enquanto seres humanos, temos uma dificuldade de lidar com a morte, porque a morte é a única experiência em que não há significação. “Para a humanidade, essa questão da morte é um tabu, porque a gente não sabe lidar, a gente não sabe o que é esse processo de morrer. E essa questão, agora, dessas perdas de vida e perdas de vidas em grande escala que a pandemia trouxe, ela tem sim uma complexidade maior do que tínhamos anteriormente”, complementa. 

Segundo a psicanalista, o processo de luto que vivenciamos é poder lembrar do ente querido e intensificar essas lembranças. Depois, o processo passa pelo que é chamado de atravessamento, quando conseguimos internalizar essas pessoas e continuarmos as nossas vidas. “Com essa questão de isolamento, nós tivemos que nos distanciar e isso provocou um sofrimento muito grande, para além do que a gente não podia ter contato com elas em muitos dos casos, principalmente em relação aos idosos, dos mais vulneráveis, que nós tivemos que manter esse distanciamento. A perda dessas pessoas vai gerar um conflito maior, porque a gente não teve essa possibilidade anterior de interação. Então, eu acredito que isso também vai se agravar”, afirma Araujo. 

Ticiana ressalta que a situação que estamos vivendo é inédita e não se sabe exatamente quais serão as consequências futuras dessas vivências que estamos tendo. “Mas acredito que esses impactos serão mais no sentido negativo. Nós vamos aprender algumas coisas positivas também com a pandemia. Mas, por enquanto, o que nós estamos vendo é, enfim, uma dificuldade em todos os âmbitos”, pontua. A docente também reflete sobre outros aspectos da pandemia, como a “dificuldade da população em relação a ao acesso à saúde, principalmente as mais impactadas socialmente, pessoas morrendo por falta de cuidado, a nossa saúde pública bastante fragilizada, a situação econômica se agravando e também a perda de pessoas queridas. Acho que todo esse conjunto de situações vão impactar de forma muito radical”, considera.

Dia de Finados

“O 2 de novembro é um ritual, onde a gente homenageia os nossos mortos, onde a gente está numa conexão maior com eles, com essas lembranças que nós temos deles, daquele tempo, daquele momento em que nós conseguimos compartilhar a nossa vida. Então, como todo ritual, ele é importante para a compreensão dessa situação e também no sentido da valorização daqueles que se foram. Poder fazer esse ritual e se conectar com essas lembranças, com essas histórias que a gente viveu com aqueles que nos deixaram é muito importante. Então, se não for possível que nós façamos uma visita até onde está o corpo do ente querido - diante desse distanciamento e do isolamento - que nós possamos, em algum momento, dentro das nossas casas, dentro de nossos lares, nos conectarmos com essas pessoas, com essas histórias, e tirar um tempo para que a gente possa então fazer essa conexão. Talvez isso ajude a acalentar os nossos corações e poder pensar então que nós conseguimos viver. Que isso possa nos fortalecer e nos fazer seguir em frente. Se nós estamos vivos, nós temos que enfrentar as dificuldades do dia a dia. E essas dificuldades, com certeza, se tornaram mais agravadas diante dessa pandemia. Então nós temos que ter muita força, muita coragem, para conseguirmos atravessar esse período, avançar, mas, sem dúvida, isso vai nos deixar uma marca na nossa história de vida, isso vai deixar também uma marca na história da humanidade”.


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