A edição 303, em 11 de dezembro de 1927, foi a última publicação de O PROGRESSO em Ponta Porã. Na época, o diretor proprietário José dos Passos Rangel Torres, foi nomeado promotor de Justiça, o que o impediu de continuar à frente do impresso pioneiro. Na edição de despedida, o periódico trouxe uma reflexão sobre a Justiça brasileira da época.
“Nessa questão de condenação dos revolucionários paulistas pelo Supremo Tribunal Federal e que nos faz repetir a sentença, é o seu grão de paixão e de ódio que ella envolve, além do retrocesso da jurisprudência firmada em todas as Cortes de Justiça dos países civilizados. Nunca no Brasil se apllicou leis penais de efeitos retroativos. Os ministros que deram visto a causa do bernardismo, fiquem com a primasia”, registra o texto.
Em outro trecho, o Editorial finaliza com uma mensagem que é adequada até para os tempos atuais. “O Brasil precisa de paz e esta só se fará com a cassação dos ódios e amortecimento das paixões de partidarismo. Que venha a paz completa ao seio da nação brasileira”. Como estava o Brasil: Em 12 de outubro de 1927, no Palácio do Catete, o presidente Washington Luiz assinava uma Lei que ficaria conhecida como Código de Menores.
Hoje, passados 92 anos, a canetada do último presidente da República da política Café com Leite é alvo das mais exaltadas discussões no governo, no Congresso e na sociedade. Foi o Código de Menores que estabeleceu que o jovem é penalmente inimputável até os 17 anos e que somente a partir dos 18 responde por seus crimes e pode ser condenado à prisão. O que agora está em debate no país é a redução da maioridade penal para 16 anos.
O Código de 1927 foi a primeira lei do Brasil dedicada à proteção da infância e da adolescência. Ele foi anulado na década de 70, mas seu artigo que prevê que os menores de 18 anos não podem ser processados criminalmente resistiu à mudança dos tempos. É justamente a mesma idade de corte que hoje consta da Constituição e do Código Penal, além do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) — uma espécie de filhote do Código de Menores que nasceu em 1990 . A pioneira lei, que foi construída com a colaboração do Senado, marcou uma inflexão no país.
Até 1927: O PROGRESSO se despede de Ponta Porã ARQUIVO então, a Justiça era severa com os pequenos infratores. Pelo Código Penal de 1890, criado após a queda do Império, crianças podiam ser levadas aos tribunais a partir dos 9 anos da mesma forma que os criminosos adultos. De acordo com a Agência Senado, em 1922, uma reforma do Código Penal elevou a maioridade de 9 para 14 anos.
Com o Código de Menores de 1927, chegou-se aos 18 e a prisão de crianças e adolescentes ficou proibida. Em seu lugar, teriam de ser aplicadas medidas socioeducativas, como se chamam hoje. No caso dos então chamados «delinquentes» com idade entre 14 e 17 anos, o destino seria uma escola de reforma (ou reformatório), onde receberiam educação e aprenderiam um trabalho. Os menores de 14 anos que não tivessem família seriam mandados para a escola de preservação, uma versão abrandada do reformatório.
Os mais novos com família poderiam voltar para casa, desde que os pais prometessem às autoridades não permitir que os filhos coincidissem. Extenso e minucioso, o Código se dividia em mais de 200 artigos, que iam além da punição dos pequenos infratores. Normatizavam desde a repressão do trabalho infantil e dos castigos físicos exagerados até a perda do pátrio poder e a criação de tribunais dedicados exclusivamente aos menores de 18 anos.
No Brasil da virada do século 19 para o 20, uma parcela considerável da população vivia na miséria. Com o fim da escravidão, em 1888, os negros e suas famílias se viram abandonados de uma hora para a outra, elevando as estatísticas da pobreza. A ainda tímida industrialização atraía gente do campo, mas não conseguia absorver toda a mão de obra disponível.
As cidades inchavam, e o desemprego e a criminalidade disparavam. Às crianças e aos adolescentes restavam dois caminhos. Ou trabalhavam, submetidos a serviços pesados ou perigosos por pagamentos irrisórios ou perambulavam pelas ruas das cidades grandes, cometendo roubos, aplicando golpes ou pedindo esmolas. Naquela altura, as escolas públicas eram raras e estavam reservadas para os filhos das classes abastadas.